O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta quinta-feira (30/3) que a nova proposta de arcabouço fiscal não é uma “bala da prata”, mas sim um “plano de voo”. Ao anunciar a nova regra, o titular da pasta federal afirmou que haverá um piso para investimentos públicos.
Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, o piso dos investimentos atualmente, em 2023, está entre R$ 70 bilhões e R$ 75 bilhões. Esse piso será corrigido pela inflação ao longo do tempo.
“Se nós cumprirmos essas trajetórias, com esses mecanismos de controle, nós vamos chegar a 2026 em uma situação de bastante estabilidade no que diz respeito a esses agregados. As trajetórias de inflação, juro real e dívida pública vão se acomodar em uma situação muito mais favorável do que a que nós encaramos hoje”, afirmou Haddad durante a apresentação do novo arcabouço fiscal, na sede do ministério. A regra proposta pelo governo Lula (PT) vai substituir o teto de gastos (veja detalhes abaixo).
A nova medida estipula que o aumento das despesas do governo será limitado a 70% do crescimento das receitas. Por exemplo, se a arrecadação federal subir 10%, o governo poderá aumentar os gastos em 7%.
Também é estabelecido um intervalo para a meta de resultado primário (saldo entre o que se arrecada e o que se gasta, descontado o pagamento dos juros da dívida). Esse intervalo, chamado de banda, vai funcionar nos moldes do atual sistema de metas de inflação, que estipula um centro e intervalos de tolerância, todos pré-estabelecidos.
Caso haja um bom desempenho das contas públicas, isto é, se o resultado primário ficar acima do teto da banda, a regra permite a utilização do excedente para investimentos.
Em 2024, o governo estabeleceu como meta zerar o déficit primário das contas públicas. Para 2025, terceiro ano de mandato de Lula, o objetivo será de superávit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Já em 2026, a meta será de 1% do PIB.
O atual teto de gastos, em vigor desde 2017, estabelece que as despesas públicas federais só podem crescer o equivalente ao gasto do ano anterior, sendo este corrigido pela inflação.
A regra foi criada no governo de Michel Temer (MDB), quando o país passava por recessão marcada pela crise fiscal e gastava mais do que arrecadava, acumulando sucessão de déficits primários. Na época, o argumento usado era que a regra orçamentária iria controlar os gastos públicos.
Pela norma fiscal, a meta do resultado primário é estipulada em valor numérico a cada ano. O resultado é elaborado a partir da diferença entre receitas e despesas no ano. Atualmente, esta é a única meta que precisa ser cumprida pelo Executivo federal.
Pela nova proposta do governo, em vez de um teto, o aumento das despesas do governo será limitado a 70% do crescimento das receitas. Por exemplo, se a arrecadação federal subir 10%, o governo poderá aumentar os gastos em 7%.
O texto, porém, impõe um limite mínimo para a variação, com o objetivo de evitar que uma queda brusca ou temporária na arrecadação federal obrigue o governo a comprimir os gastos. Propõe ainda um limite máximo de variação, que afasta o risco de o Executivo federal aumentar os gastos públicos de forma exagerada quando há uma alta na arrecadação.
Diferentemente da norma atual, que tem uma única meta de resultado das contas públicas, a equipe econômica quer que o novo arcabouço tenha um intervalo, também chamado de “banda”, para cumprir as metas.
Por exemplo, se o governo, em um determinado ano, não cumprir o intervalo da meta, no ano seguinte as restrições para despesas serão maiores. O objetivo é evitar o descontrole das contas públicas.
- Haddad nega criação de impostos para cumprir novas regras fiscais
O cumprimento das metas de resultado primário previstas no novo marco fiscal não envolverá a criação de impostos ou aumento de alíquotas atuais, disse nesta quinta-feira (30), em Brasília, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ele, no entanto, admitiu que algumas desonerações para setores específicos poderão ser revertidas.
“Se, por carga tributária, se entende a criação de tributos ou o aumento de alíquota, não está no nosso horizonte. Não estamos pensando em criar uma CPMF [antigo imposto sobre transações financeiras], nem em onerar a folha de pagamentos”, declarou o ministro ao apresentar o projeto de lei complementar do novo arcabouço fiscal.
Mesmo sem a criação de tributos, o ministro disse que alguns setores que há décadas se beneficiam com desonerações poderão ter os incentivos fiscais revistos. Em alguns casos, setores novos ainda não regulamentados poderão ter cobrança de impostos, como as apostas esportivas online.
“Temos muitos setores demasiadamente favorecidos com regras de décadas. Vamos, ao longo do ano, encaminhar medidas para dar consistência a esse anúncio. Sim, contamos com setores que estão beneficiados e setores novos que não estão regulamentados [como as apostas eletrônicas esportivas]”, afirmou o ministro. “Vamos fechar os ralos do patrimonialismo brasileiro e acabar com uma série de abusos que foram cometidos contra o Estado brasileiro”, acentuou.
Para o ministro, uma revisão geral dos incentivos fiscais beneficiará toda a população e permitiria ao Banco Central reduzir os juros no futuro. Haddad pediu sensibilidade ao Congresso Nacional para que revise os benefícios fiscais - atualmente em torno de R$ 400 bilhões por ano - e cuja revisão foi determinada por uma emenda constitucional de 2021.
“Se quem não paga imposto passar a pagar, todos nós vamos pagar menos juros. É isso que vai acontecer. Agora, para isso acontecer, aquele que está fora do sistema tem que vir para o sistema. O Congresso tem que ter sensibilidade para perceber o quanto o seu desejo foi aviltado na prática pelos abusos e corrigir essas distorções”, salientou.
Na avaliação do ministro da Fazenda, a flexibilidade trazida pelo novo arcabouço em momentos imprevistos na economia trará regras e mais credibilidade. Segundo Haddad, as regras associaram o que chamou de “o melhor dos dois mundos”, ao combinar dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal e um limite de despesas mais flexível que o antigo teto de gastos.
“Traçamos uma trajetória consistente de resultado primário em que necessariamente a despesa vai correr atrás da receita e, portanto, vai ampliar o espaço para dar sustentabilidade para as contas públicas”, explicou.
A seguir, ele disse que o limite de 70% de crescimento dos gastos será calculado sobre o crescimento das receitas nos 12 meses fechados em julho, antes do envio do Orçamento do ano seguinte para o Congresso. De acordo com o ministro, essa mudança é necessária para evitar um problema recorrente no Orçamento brasileiro: o inchaço de estimativas de arrecadação pelo Congresso.
Ele justificou a banda na meta de resultado primário – margem de tolerância de 0,25 ponto percentual (pp) do Produto Interno Bruto (PIB), para cima ou para baixo, com base na necessidade de evitar instabilidades na execução do Orçamento perto do fim do ano.
“A meta [de superávit primário] tem uma pequena banda também para evitar a sangria desatada de fim de ano ou para gastar mais sem planejamento, para gastar mais ou então cortando despesas de maneira atabalhoada”, explicou.
O ministro não informou uma data de envio do projeto de lei complementar do novo arcabouço ao Congresso. Segundo Haddad, o governo aproveitará o recesso de Semana Santa para elaborar um texto cuidadoso. A ministra Tebet informou ter colocado dois secretários – de Orçamento Federal e o secretário-executivo da pasta – à disposição do Ministério da Fazenda para ajudar na redação do projeto.
Também presente ao anúncio do novo arcabouço fiscal, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, reforçou o coro em relação à previsibilidade e credibilidade das novas regras. Ela informou que o governo pretende trabalhar para melhorar a qualidade dos gastos públicos.
“Depois dos primeiros números chegados, vimos que essa regra fiscal é crível, é possível e temos condição de cumpri-la. Porque ela tem flexibilidade e permite que façamos ajustes para atingir as metas. Estamos convictos de que, se o Congresso aprovar esse arcabouço, conseguiremos atingir a meta: diminuir as despesas dentro do possível com qualidade do gasto público. E vamos procurar zerar esse déficit e ter possibilidade de superávit em 2025”, prometeu.
Fonte: Agência Brasil - Metropoles